Chamada aberta - Dossiê Poesia e Infância

2024-02-02

POESIA & INFÂNCIA

A imaginação crítica e poética da modernidade, já com os românticos, é tocada por diferentes
tipos de aproximações entre a atividade do escritor e a da criança. Em Baudelaire, temos um
fracionamento na perspectiva psicologizante dessa relação, quando a atividade da escrita,
antes de se prestar a uma transposição sublimadora da infância ou de outro tipo qualquer de
associação entre produção literária e aspecto biográfico, lança a figura do “gênio criador” em
afinidade direta com a infância e a força criativa da infância, na qual a criação vai aparecer
como uma espécie de “ressurgência”; o que, para René Schérer, será formulado na expressão
“devir-criança”, de Gilles Deleuze e Félix Guattari. Elemento temático incontornável a tantas e
distintas poéticas, a infância se transmuta e se reconfigura a cada voz que a expressa ou
anuncia, sendo muitas as suas armadilhas imagéticas ou retóricas. Uma breve genealogia
crítica da relação entre as figuras do poeta e da criança já apontaria para uma relação
intrínseca entre a ideia da infância como invenção de uma categoria forjada no século XVIII e
os novos modos de enunciação da lírica moderna. Em sua acepção figurativa disruptiva e
múltipla, como uma lógica própria do imaginário (Daniel Link, 2014), próxima talvez ao que
Arturo Carrera vai designar em um de seus versos como “inocência sinuosa”, ou o que Manuel
António Pina chama, com as palavras de Nietzsche, de uma “segunda, mais perigosa
inocência”, ou ainda, em contraponto, como uma forma outra de dizer “suavidade”, como
sugere Dufourmantelle (“A suavidade pertence à infância, é seu nome secreto”), pode a
infância elaborar horizontes epistemológicos nos estudos de poesia? Com esta pergunta, o
presente número convoca textos que abordem a relação entre infância e poesia em seus
múltiplos desdobramentos.

CARRERA, Arturo. A inocência. Trad. Rodrigo Alvarez. Rio de Janeiro: Ed. 7Letras, 2010.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs. Capitalismo e Esquizofrenia. Vol. IV. São Paulo:
Editora 34, 1997.
DUFOURMANTELLE, Anne. Potências da suavidade. Trad. Hortência Santos Lencastre. São
Paulo: N-1 Edições, 2022.
LINK, Daniel. La infancia como falta. Cuadernos LIRICOS, n. 11, Dez. 2014 – Revista de la red
interuniversitaria de estudios sobre las literaturas rioplatenses contemporáneas en Francia.
Disponível em: https://journals.openedition.org/lirico/1798?gathStatIcon=true&lang=fr
PINA, Manuel António. Todas as Palavras ‒ poesia reunida. Lisboa, Assírio & Alvim, 2012.
SCHÉRER, René. Infantis – Charles Fourier e a infância para além das crianças. Trad. Guilherme
João de Freitas Teixeira. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2009.

Organização: Leonardo Gandolfi (UNIFESP) e Paloma Roriz (PUC-Rio/Faperj)

Prazo para envio de trabalhos: 30/05/2024

Previsão de publicação: setembro de 2024